ATA DA QUADRAGÉSIMA QUARTA SESSÃO SOLENE DA SEXTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA NONA LEGISLATURA, EM 08.09.1988.

 


Aos oito dias do mês de setembro do ano de mil novecentos e oitenta e oito reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Quadragésima Quarta Sessão Solene da Sexta Sessão Legislativa Ordinária da Nona Legislatura, destinada a entregar o Título Honorífico de Cidadã Emérita à Jornalista Iara de Almeida Bendati, concedido através do Projeto de Resolução nº 26/88. Às dezessete horas e trinta e cinco minutos, constatada a existência de “quorum”, o Sr. Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Ver. Brochado da Rocha, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Jorn. Nestor Fedrizzi, Secretário de Recursos Humanos e Modernização Administrativa do Estado; Jorn. Antonio Firmo de Oliveira Gonzalez, Diretor da Faculdade dos Meios de Comunicação, FAMECOS, representando, neste ato, o Magnífico Reitor da PUC, Irmão Norberto Rauch e o Presidente da Associação Riograndense de Imprensa, ARI, Jorn. Alberto André; Jorn. Luiz Carlos Vergara Marques, representando, neste ato, o Magnífico Reitor da UFRGS, Prof. Gehrard Jacob; Jorn. Iara de Almeida Bendati, Homenageada; Jorn. Aníbal Bendati, esposo da Homenageada; Ver. Lauro Hagemann, 3º Secretário da Casa. A seguir, o Sr. Presidente concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Ver. Lauro Hagemann, em nome das Bancadas do PCB e do PSDB, discorreu sobre a vida de Iara de Almeida Bendati, relatando episódios que viveram juntos e dizendo que S. Sa. sempre foi uma figura preocupada com a sua categoria profissional, a qual soube honrar. Ao finalizar, declarou que a Galeria de Cidadãos Eméritos de Porto Alegre sente-se engrandecida com a inclusão do nome da Homenageada. O Ver. Flávio Coulon, em nome da Bancada do PMDB, leu discurso escrito pelo seu assessor Nei Gastal, antigo aluno da Homenageada, onde este relata o amor de S.Sa. pelo jornalismo, comentando passagens da sua vida e ressaltando a forma criativa como superou os obstáculos encontrados. O Ver. Antonio Hohlfeldt, em nome da Bancada do PT, falou sobre a importância do papel representado pela Homenageada junto ao setor de comunicação social do Estado, seja como jornalista ou como professora. Salientou que S. Sa. sempre foi um referencial na busca de um trabalho coerente e responsável junto à imprensa, mesmo durante o período ditatorial. E o Ver. Brochado da Rocha, como proponente da Sessão e em nome das Bancadas do PDT, PDS, PFL, PL e PC do B, declarou que seu pai foi professor da Jorn. Iara de Almeida Bendati, analisando os motivos que o levaram a propor a presente Sessão e o legado profissional construído pela Homenageada, como presença de valor inestimável junto ao setor jornalístico gaúcho. Após, o Sr. Presidente convidou o Ver. Brochado da Rocha

a proceder a entrega do Título Honorífico de Cidadã Emérita à Jorn. Iara de Almeida Bendati e concedeu a palavra a S. Sa., que agradeceu a homenagem prestada pela Casa. Em continuidade, o Sr. Presidente convidou o Jorn. Antonio Firmo de Oliveira Gonzáles a proceder à entrega de flores para a Homenageada. A seguir, o Sr. Presidente fez pronunciamento alusivo à solenidade, convidou as autoridades e personalidades presentes a passarem à Sala da Presidência e, nada mais havendo a tratar, levantou os trabalhos às dezoito horas e trinta minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelos Vereadores Brochado da Rocha e Lauro Hagemann e secretariados pelo Ver. Lauro Hagemann. Do que eu, Lauro Hagemann, 3ª Secretário, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1ª Secretária.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Brochado da Rocha): Declaro abertos os trabalhos da presente Sessão Solene, e convido o Ver. Lauro Hagemann para falar em nome das Bancadas do PCB e do PSDB.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Sr. Presidente, Ver. Brochado da Rocha, Srs. Vereadores, meus caros Iara e Aníbal Bendati, companheiros jornalistas que hoje se fazem presentes aqui nesta Casa do Povo, em número bastante acentuado, para não dizer a maioria, colaborando para prestigiar a entrega de um título honorífico a uma de nossas mais conceituadas companheiras.

A prática da tribuna deixa, geralmente, o Vereador, o Deputado, o Parlamento, com uma certa desenvoltura. Mas, hoje, devo confessar que me sinto muito pequeno para poder expressar tudo o que deveria, sobre a personalidade de Iara. É quase que um olhar para dentro de mim mesmo, para poder dizer algumas das coisas que passamos juntos nestes 35 anos de relacionamento. É quase que uma existência. Não foram poucos os momentos que vivemos na nossa profissão, nas nossas vidas particulares, nas lides universitárias, que possam ser traduzidas em breves palavras.

Ingressamos, a Iara e eu, no então Curso de Jornalismo, da Faculdade de Filosofia, em 1953, na segunda turma. Como dizia, é quase que um olhar para dentro. E me lembro daquela turma, era pequena: Cipriano Bernd, já falecido; Carlos Regius, ainda em atividade; Walter Irgand; Joseph Zucalsca; Edmundo Soares, ainda em atividade; Iara de Almeida, não era ainda Bendati e este Vereador. A Iara acumulava a função de estudante de jornalismo com a função de professora primária na Barra do Ribeiro. Não era fácil para ela e todos nós sabíamos disso, a conciliação das duas atividades. Iara morava em Porto Alegre, tinha que viajar diariamente até a Barra do Ribeiro e, naquele tempo ainda, a faculdade exigia que os estudantes tivessem presença. Tanto foi difícil que, a partir do segundo ano, nós perdemos a Iara. Ela não pode mais continuar com a turma. Por isso ela se formou um ano depois de nós. Mas mantivemos, assim mesmo, um contato permanente. A Iara profissional, me lembro muito bem da sua tenacidade como repórter, uma das coisas mais difíceis no jornalismo: o questionamento dos entrevistados. A correta percepção das respostas e a transcrição delas. E a Iara foi uma repórter de excelente reputação nesta Cidade. Me lembro da criação da Rádio da Universidade, o primeiro departamento de jornalismo da incipiente emissora universitária, me foi atribuída a tarefa de coordená-lo e a primeira pessoa convidada a participar do incipiente departamento foi a Jornalista Iara de Almeida. Perdoem que fale muito em termos pessoais, mas eu dizia que passei com a Iara muitos episódios em conjunto e aquele incipiente departamento de jornalismo da Rádio da Universidade teve uma característica muito especial. Foi, talvez, o primeiro encontro da imprensa de Porto Alegre, que só aceitava egressos dos cursos de jornalismo. Naquele tempo, ainda, a profissão de jornalista era exercida por cidadãos que tinham a melhor qualificação profissional, mas que não dispunham do diploma de jornalista. Os cursos recém estavam iniciando. E nós fizemos do Departamento de Jornalismo da Rádio da Universidade um modelo pioneiro, na exigência deste diploma, como uma forma não corporativa, mas como uma forma de prestigiar o curso que a própria Universidade mantinha. Acreditávamos que não estávamos fazendo nada de anormal, não estávamos exigindo uma prerrogativa impossível de ser cumprida; era uma decorrência lógica daquilo que a Universidade praticava, entre os seus vários cursos, e daquilo que a sua emissora exigiria dali para frente. E isto passou a ser uma regra: que a emissora, com seus trinta anos de existência, vem mantendo. Depois a Iara foi para a Universidade. A Universidade Federal estava com seus quadros didáticos praticamente lotados. A PUC iniciava uma reformulação do seu curso e a Iara foi lecionar lá, na FAMECOS. Então, ao longo deste 35 anos que nos conhecemos profissionalmente, socialmente, foram muitos os trajetos percorridos. Veio a criação do Sindicato dos Radialistas. A Iara, antes disso, já havia militado no Sindicato dos Jornalistas. Há esta outra faceta da vida profissional da Iara e merece ser registrada: ela sempre foi uma profissional preocupada com a situação da sua categoria.

Iara casou com esta figura ímpar, Aníbal Bendati, o homem que revolucionou a feição gráfica da imprensa brasileira. Pouca gente se lembra disto. Foi chamado pelo Samuel Weiner para programar a Última Hora, veio da Argentina, foi para o Rio, depois veio para cá. Depois, como dizemos nós os gaúchos, se aquerenciou por aqui, acabou casando com a Iara, tem duas filhas, Maria Mercedes e a Lúcia.

Mas nem só da profissão de jornalista viveu o casal. Eu posso testemunhar, também, a inclinação política do casal. Nos idos de 64, um pouco além, quando este País viveu momentos de angústia, de perseguição, até de terrorismo, e que nós jornalistas, de certa forma, tivemos episódios marcantes nestas questões, o casal, muitas vezes, abrigou em sua casa companheiros perseguidos.

Por isto, ao nos identificamos com a Iara, com o Aníbal, não só profissional, social, mas também politicamente, queremos dizer, com muita clareza que, em raríssimas ocasiões, a galeria dos cidadãos eméritos desta Cidade foi tão dignificada quanto hoje, com o ingresso, nesta galeria, da Jornalista Iara de Almeida Bendati. Meus parabéns Iara. A cidadania de Porto Alegre sente-se orgulhosa de te ter em nosso meio. Muito obrigado. (Palmas.)

 (Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Flávio Coulon, que falará em nome da Bancada do PMDB.

 

O SR. FLÁVIO COULON: Sr. Presidente, Brochado da Rocha, Srs. Vereadores, Jornalista Iara de Almeida Bendati, homenageada nesta Sessão, meus senhores e minhas senhoras. Deus me avisou de que eu iria ter uma parceria muito indigesta, nesta homenagem, com Lauro Hagemann, Antonio Hohlfeldt e Brochado da Rocha, e por isso, usei um estratagema, solicitando a um dos meus assessores, teu ex-aluno, que escrevesse o discurso, e agora, tu vais poder dar nota, e dizer como é que esse teu ex-aluno anda se comportando - estou procurando ele, mas acho que ele fugiu, é o Nei Gastal.

Meus senhores, minhas senhoras. Estamos aqui reunidos para homenagear Iara. Mais que isto. Estamos reunidos para homenagear a Comunicação Social. Pois falar em Iara é falar na Comunicação que ela abraçou com tanto entusiasmo. Não resisto, porém, à tentação de fazer um registro curioso. Logo ela, que sempre dedicou a vida à divulgação da informação precisa e verdadeira, carrega, do berço, aquilo que na linguagem jornalística se chama de “barriga”, ou seja, uma informação errada. Nascida no dia 6 de fevereiro, Iara foi registrada por seu pai como se tivesse vindo ao mundo no dia 7. Talvez no contraponto deste equívoco tenha nascido seu amor pela informação correta. É, também, ao que se saiba, o único equívoco de seu currículo. Por sinal, um belo currículo.

Repassando suas páginas, vamos encontrar a menina de origem humilde, que encontrou no Curso Normal a única opção profissionalizante em uma época em que a mulher era mais segregada do que é hoje. Professora do Estado após aprovação em concurso público, foi designada para Barra do Ribeiro. Era preciso cruzar o Guaíba de barco, a cidade ficava longe, mas Iara foi para lá. Passava a semana em uma pensão, com outras colegas, e só nos sábados e domingos voltava para casa. E pensar que hoje há quem reclame ter que dar aulas em outro bairro, que não o mais próximo de sua casa. Em algum lugar dos últimos anos perdeu-se a fórmula que temperava a fibra de gente como Iara.

Mas ela não perdeu a sua. Aprovada no vestibular do curso de Jornalismo da Faculdade de Filosofia da UFRGS, formou-se em 1956, sendo oradora da turma. Iniciou então suas atividades na nova profissão, primeiro em “A Hora”, logo também como redatora do setor de notícias da Rádio da Universidade. E vou aqui cometer uma indiscrição, no que, tenho certeza, serei perdoado por ela. É que Iara, na época, não era o que se poderia chamar de “exímia datilógrafa”. Pelo contrário, “catava milho” ao teclado da máquina com apenas dois dedos, o que certamente não a ajudava a superar os preconceitos machistas dominantes nas redações de então. Para não ser percebida nesta limitação, Iara desenvolveu uma acurada habilidade, a de “bater de ouvido”. Quando o ruído das máquinas de escrever enchia a sala de redação, ela saía a catar as letras. Quando, porém, os colegas paravam, ou diminuíam o ritmo, ela também parava, de modo a não ser ouvido seu ritmo lento. Insegurança de iniciante, pois o que vale não é a velocidade com que a matéria é escrita, mas seu conteúdo, o que Iara percebeu em seguida. Hoje, respeitada no Rio Grande e no Brasil, dobrou sua capacidade datilográfica de dois para quatro dedos, situação que compartilha com alguns dos maiores nomes do jornalismo nacional, sem complexos nem preocupações. Tanto assim que posso narrar aqui estes episódios extremamente humanos de sua carreira, pequenas inconfidências que nos foram transmitidas por Ceça, sua filha.

Profissionalmente, sua carreira passou pela “Última Hora”, pela Assessoria de Imprensa da SEC, pela criação do Museu da Comunicação Social Hipólito José da Costa, pela experiência inovadora do “Carrinho” e por dezenas de outras atividades, impossíveis de serem aqui enumeradas. Uma, porém, marcou sua vida para sempre. A partir de 1967, começou a lecionar na Faculdade dos Meios de Comunicação Social da PUC, a FAMECOS. Lá, fez parte do grupo que transformou aquela Faculdade em uma das melhores do Brasil. Durante vinte anos, contribuiu para a formação de uma nova geração de jornalistas. Dezenas dos profissionais que hoje atuam na área foram seus alunos.

Paralelamente, desenvolveu intensa atividade sindical. Em uma época em que era difícil ser professor, mais difícil ainda ser jornalista, e extremamente perigoso ser sindicalista, Iara desenvolveu as três atividades simultaneamente. Deixou marcada sua atuação como secretária do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Porto Alegre. Participou intensamente de todas as lutas pela dignificação profissional. Deixou seu nome gravado na História do jornalismo gaúcho.

E como jornalismo também é concisão, é tempo, vou parando por aqui. Haveria mais, muito mais, a contar sobre Iara e sua vida, sobre Iara e sua carreira, e até sobre Iara e seu Aníbal, companheiro desde 1960, apoio de todas as horas. Mas outros também irão falar, e, de certa maneira, a própria homenagem fala por si, apesar de redundante. É que a entrega do título de Cidadã Emérita à Iara Bendati apenas oficializa uma coisa que já era sabida por todos: que ela é, efetivamente, uma pessoa muito especial. Especial para seus colegas, especial para seus amigos e especial para todos nós, que vivemos na cidade de Porto Alegre. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Ver. Antonio Hohlfeldt, que falará, neste ato, em nome da Bancada do PT.

 

O SR. ANTONIO HOHLFELDT: Exmo. Ver. Brochado da Rocha, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, Senhores Vereadores, meu colega Lauro Hagemann, 3º Secretário desta Casa, meus queridos Aníbal e Iara. A vantagem de algumas Sessões, de alguns atos como este que hoje temos na Câmara Municipal de Porto Alegre, é que a gente consegue reunir amigos, rever pessoas, e para falar de certas pessoas, como Iara, a gente acaba falando da gente mesmo e de coisas que nos tocam muito de perto: a gente acaba fazendo um balanço. O Flávio me traiu porque pensei que ele ia falar por ele próprio e usou o Nei Gastal que é da mesma geração que eu. Eu ia falar pela geração dos alunos da Iara Bendati e não vou poder fazer isso agora; vou ter que acrescentar alguns dados já que o Lauro falava aqui essencialmente como companheiro, e eu tinha imaginado dizer, “olha fui aluno da Iara Bendati”. O Nei Gastal me passou para trás neste sentido. Aliás, acho que ele mereceu uma boa nota, não é Iara? Um bom repórter buscando os dados da biografia da Iara e de toda uma série de coisas que foram vividas pela Iara e pelo Aníbal, porque é difícil separar este casal, estes dois profissionais aqui em Porto Alegre. Mas eu queria não completar, mas lembrar alguns outros aspectos que acho são muito importantes.

Quando eu li nos papéis da Câmara, que nós recebemos diariamente, de que o Ver. Brochado da Rocha estava propondo este título, a primeira reflexão que me veio foi exatamente gozada, por que não outro Vereador anteriormente não havia feito isso? E isso me traz uma reflexão que me parece básica para se entender o papel, o significado da Iara entre nós. No futebol a gente costuma dizer que o bom juiz é aquele que não aparece: apita e não incomoda. É exatamente o papel, o significado do trabalho da Iara Bendati nesta Cidade. Não há praticamente jornalista da geração que eu pertenço em diante, portanto que entrou na Faculdade nos anos 60 que não tenha em algum momento cruzado com a Iara Bendati, como aluno, como estagiário, como colega, seja colega dentro da Rádio da Universidade, seja colega dentro da Faculdade, enfim, nas situações mais diversas, seja em redação de jornal. Perguntava lá para o Carlos Zurbin e o Carlos Zurbin dizia: “não, eu fui estagiário da Iara”; perguntava para outros e eles diziam:  “não, fui estagiário da Iara”. Quer dizer, a toda uma geração, todo um conjunto de profissionais que hoje estão atuando e que, necessariamente, se encontram com a Iara. E, no entanto, a Iara é dessas figuras que a gente encontra diariamente – já fui aluno da Iara, já fui entrevistado pela Iara, sou colega da Iara – e que não lembra. É uma falta nossa. Ela entra tão dentro do convívio do dia-a-dia que precisa um fato especial, uma coisa fora do comum, para a gente registrar a sua presença; no entanto, ela está colocada dentro de cada um de nós. E me parece que essa função é tão mais importante porque, como lembrava o Lauro o período de formação e o período pós 64, eu gostaria de me fixar nesse período mais difícil da nossa geração, que pegou esse barco mais pesado no sentido de que o final da nossa formação já foi feita sob o período da ditadura. E foi muito importante que nós encontrássemos, em certos momentos, nas salas de aula, nas redações de jornais, profissionais que não aderissem ao poder, por interesse, ou por medo, ou, simplesmente, porque até estavam de acordo com a nova ordem ou a nova desordem vigente neste País. Nesse sentido, a Iara, o Aníbal e alguns poucos companheiros mais, ficaram sempre como referenciais para todos nós, que vivemos essa profissão que, ao mesmo tempo está tão perto do poder e que também se obriga, enquanto profissionais, a se manter o mais longe possível, como diz o Alberto Diniz, numa entrevista famosa: “Eu não aceito de político nem abraço, de vez que no abraço pode vir uma coptação”. Nesse sentido me parece que a posição ocupada pela profissional na redação, depois, enquanto professora, foi sempre de uma lição fundamental de seriedade, de compostura, de objetividade, mas, sobretudo, num aspecto muito importante para nós que militamos profissionalmente nessa área: é que existe toda uma mitificação em torno do jornalista. O jornalista boêmio, o jornalista meio porra-louca, o jornalista que sai por aí meio descompromissadamente e que entre um momento e outro de loucura, consegue produzir alguma matéria para o jornal. E eu acho que com Iara – e vejo aqui vários companheiros do Museu de Comunicação, como o Francisco Rüdiger, o pessoal da FAMECOS – a gente aprende um outro lado. A preocupação da Iara, enquanto profissional, de mostrar que o nosso lado de jornalista é tão científico, tão rigoroso, tão sério, tão exigente quanto qualquer outra preocupação. Pelo menos era isso que o Urbim me recordava agora, ele que foi estagiário da Iara – a cobrança – no sentido de que o jornalista deve ser um profissional realmente habilitado a realizar a sua função, que se leve a sério. Isso é, inclusive, uma coisa que se vive hoje, tanto nos cursos de graduação como nos cursos de especialização, ou seja, a preocupação que nós temos de formar, teoricamente, profissional, que ele não seja apenas um cidadão que saía por aí a fazer perguntas, mas que tenha um objetivo, que ele saiba aonde ele quer chegar com esse conjunto de perguntas que ele vai colocar. E mais do que isso: que a organização de um texto, que a entonação de uma voz, quando estivermos no Rádio ou na Televisão tem resultados diversos em relação ao receptor daquela informação. Acho que este tipo de coisa foi sempre trabalhado muito pela Iara e não é por nada, enquanto professora, a Iara atuou tanto na área da teoria quanto na área da redação do texto, cobrando do seu aluno, corrigindo, cortando, ensinando para ele que há palavras supérfluas, mas que também há palavras essenciais, que há algumas que não podem ser prescindidas de maneira alguma e outras que podem ser retiradas do texto porque vão apenas ocupar espaço sem maiores conseqüências.

Portanto essa qualificação, essa disciplina, que não é apenas formal, mas uma qualificação que dá consciência do profissional, a responsabilidade social do profissional e quando falamos social, falamos em política do profissional, que é alguma coisa muito importante em toda a influência que a Iara deixou em várias gerações e continua deixando na medida em que continua atuando nesses setores. Não vou lembrar aqui todo o seu trabalho na Rádio Universidade, que o Lauro recordou muito bem, não vou lembrar todo o seu trabalho na atividade sindical que foi lembrada também pelo Lauro e pelo Flávio, ou no Museu de Comunicações. Eu queria fazer aqui dois registros: primeiro, que se tocou apenas de passagem, se falou aqui do machismo e eu imagino que a Iara teria muitas histórias a contar na medida em que, na época em que ela começou, ainda era raro mulher ter como profissão: jornalista. Só para se ter uma idéia, sempre é bom se recordar, a redação do “Correio do Povo” não tinha banheiro para jornalista-mulher, tinha que ir no andar de cima e acho que a “Folha da Tarde” não era diferente, e não sei se a “Última Hora” também não tinha esse problema. Aí nós temos bem a marginalização, a idéia de que mulher não tinha condições de participar profissionalmente desta área do jornalismo, se isolava, e se colocavam desafios muito maiores. Portanto, neste sentido a Iara foi de uma certa maneira uma pioneira, junto com outras colegas. O enfrentamento, a garantia, não apenas como um novato dentro da profissão, mas, sobretudo, por ser uma jornalista mulher.

O Lauro não mencionou, por exemplo, que o Aníbal, entre tantas coisas, também cometeu os quadrinhos, integrou o movimento muito importante dos quadrinhos verde-amarelo. Brigou por ter um quadrinho latino-americano, quadrinho brasileiro. Isto um pouco antes de 1964. Ainda tenho lá os quadrinhos arquivados, nos arquivos implacáveis.

Por fim, e por isso mesmo, Iara, acho que é difícil nesta homenagem falar sobre ti, sem citar o Aníbal. Valeria a recíproca, seria muito difícil se falar em Aníbal, sem citar a Iara. E hoje em dia, não dá para falar nem de Aníbal, nem de Iara, como é o meu caso, sem citar a Lúcia, que está fazendo teatro, mais uma contribuição da família Bendati à cultura desta Cidade. Está aí o Diretor da Lúcia, o Ronald Rade, do Teatro novo. E o Aníbal, que provavelmente empurrado pela Lúcia acabou cometendo outro deslize gravíssimo, para algumas pessoas muito sérias, que é acabar virando cenógrafo de teatro, depois de velho, depois de cabelo branco vai entrar no teatro. Aliás, o Rade já não conta mais com o pai dele, puxou o outro para fazer teatro com ele.

E aí completamos um quadro das significativas contribuições que os Bendati tem trazido a esta Cidade. Por isso Iara, não vou repetir, nem Lauro, nem Flávio, ao dizer que essa homenagem é mais do que merecida. Diria apenas que vocês compõem aquela paisagem básica da Cidade.

Sem dúvida nenhuma, Porto Alegre, e isto não é figura de estilo, ficaria mais pobre se vocês não estivessem aqui conosco, por isso um abraço muito grande, e a gente espera que este título seja apenas uma ratificação, ou mais do que isso, um compromisso de que vocês não vão fugir para a Argentina, daqui a pouco, mas vão continuar aqui em Porto Alegre, conosco. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convido o Sr. 3º Secretário, Lauro Hagemann, a me substituir nos trabalhos.

 

 O SR. PRESIDENTE (Lauro Hagemann): A Mesa da Câmara tem o prazer de conceder a palavra ao Ver. Brochado da Rocha, proponente do Título de Cidadã Emérita à Jornalista Iara de Almeida Bendati, que falará em nome das Bancadas do PDT, PDS, PFL, PL e PC do B.

 

O SR. BROCHADO DA ROCHA: Iara de Almeida Bendati e demais componentes da Mesa; seleta platéia, que compõe neste momento a Câmara  Municipal de Porto Alegre para entrega de um Título.

Assim como o Flávio Coulon, que usou um colega da Iara, sabia eu das dificuldades que teria que enfrentar para esse discurso. Mas sabia um pouco mais Flávio, sabia um pouco mais Iara, eu sabia que seria apenas e tão somente uma moldura para o discurso do Ver. Lauro Hagemann. Aliás, quando formulava a proposta, pedia até desculpas ao Lauro por assim proceder. Mas acredito que se roubei o ensejo, fui roubado no discurso, muito mais ainda o Flávio Coulon. Porque, se o Flávio dispunha de um aluno de Iara eu dispunha, muito próximo de mim, de um que foi professor da Iara, mas ele nunca escreveu para mim. Escreveu para Presidente da República, escreveu para tanta gente, mas sempre me disse desde criança: faz tu as tuas coisas.

Por isso Iara, por isso meus Senhores e minhas Senhoras, falo em nome da Bancada do PDT, falo em nome de outras Bancadas nesta Casa, mas sou obrigado, também, a falar em nome do meu pai. E falar, sobretudo, um pouco diferente daqueles que me antecederam nesta tribuna. Esta Casa e esta Cidade têm, inquestionavelmente, juízos de valor.  É o juízo dos cidadãos desta Cidade que me animou a trazer aos meus pares esta proposta. Era uma vida que deveria ser resgatada para os Anais desta Câmara num pergaminho e deveria ser rasgado o elogio a esta homenageada, em consonância com aquelas pessoas que moram, habitam, trabalham em Porto Alegre, para dizer do enorme valor que nós damos, e ratificamos a uma pessoa, profissional, acima de tudo, uma pessoa com posições políticas bem conhecidas, a uma professora tão conhecida nesta Cidade, enfim, uma cidadã desta Cidade. Por isso, encaminhamos o Título, num juízo de valor, numa demonstração inequívoca que, apesar de tantos erros que possam ser cometidos num Legislativo, em alguns dias, em alguns momentos, em alguns minutos, nós temos a lucidez de recolher o que é mais caro, o que mais precioso, as pedras mais raras desta Cidade, para esculpi-las neste Plenário, trazê-las e dizer do apreço desta Casa.

Este Projeto não tramitou, ele voou. Ele, na verdade, não tinha um autor; ele tinha uma idéia. Por isso, acho que este ato representa, antes de tudo, e me permitindo ter uma discordância tão saudável com meu colega Antonio Hohlfeldt de permitirmos, saber distinguir neste ato quem é quem e por quê. Dizer bem claramente quem por nós deve entrar para a história da Cidade, quem por nós deve ser inquestionavelmente uma das pessoas em que se possa, nós outros, guiarmo-nos e ver o seu caminho. Muito mais do que este momento, muito mais do que Iara ensinou à Cidade, através de vários alunos, ela tem um legado, tem um comportamento, tem um norte a oferecer a todos aqueles que, neste tempo difícil, precisam seguir os seus caminhos, com dignidade, afirmação, competência e, sobretudo, que possam olhar o seu passado com extremo carinho. Pessoas como Iara de Almeida Bendati são para nós guia e rumo e acho que ao oferecer esse Título, a Câmara apenas escreve em pergaminho e deixa para a história da Cidade uma pessoa mais, invulgar e singular, não especialmente por se tratar de uma mulher, mas por se tratar de uma pessoa humana de valor inquestionável, cuja pessoa possamos discordar um pouco ou muito, mas que jamais deixaremos de respeitar. É este momento, com este espírito que nos encaminhamos até este momento, Iara, porque até mesmo temos que te agradecer uma coisa a mais, certamente, colaboraste decisivamente para que a cidade de Porto Alegre se apropriasse do Aníbal, que foi uma conquista para a cidade de Porto Alegre. Até isto, fazendo nos nossos meios de comunicação coisas tão inovadoras que, hoje, as coisas que estão sendo feitas passem a ser bastante retrógradas, porque já eram feitas, há mais de duas décadas, seguramente, pelo Aníbal.

Por tudo isto, Iara, recebe deste cidadão apenas palavras como estas, que vêm do coração, que vêm da razão, mas que vêm, sobretudo, de uma tentativa de, num mundo conturbado, saber onde procurar os valores e onde se escorar para seguir em frente e adiante, para perseguir novos tempos, mas não ter vergonha do tempo em que viveu. Tu tens a dimensão do tempo e a grandeza do valor, que servirá aos que hoje aqui estão presentes, e não só a eles, mas, sobretudo, àqueles que farão a história da nossa Cidade, a história do nosso Estado e a história do nosso País.

Somos profundamente gratos e estamos, neste momento, extremamente emocionados por poder dirigir-te a palavra, engrandecer esta Casa que se engrandece invulgarmente por ter a tua presença, por ter a tua palavra que se seguirá e por seres, a partir de hoje, uma das pessoas desta Casa. É um dia feliz, mas é, sobretudo, um dia de profunda emoção e carinho que cerca a todos nós. Sou grato, também, àqueles que, entendendo nosso objetivo, aqui compareceram, sabendo que assim procedíamos para deixar o nosso agradecimento, a nossa gratidão, o nosso, enfim, carinho e o nosso profundo sentir e pensar de como pode ser o mundo, como poderia ser o mundo que sonhamos. Isto é tudo Iara. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Em nome da Mesa da Câmara Municipal tenho a honra e prazer de convidar o Ver. Brochado da Rocha, Presidente da Casa e da Sessão, a proceder à entrega do título de Cidadã Emérita à Jornalista Iara.

 

(O Sr. Brochado da Rocha procede à entrega do Título.)

 

O SR. PRESIDENTE (Brochado da Rocha): E para finalizar, vamos ao mais importante para nós, que é podermos ouvir a nossa homenageada.

 

A SRA. IARA DE ALMEIDA BENDATI: Recebi o comunicado, desse ato, numa reunião de departamento, e disse, na frente de todo mundo, que era demais para mim. E eu continuo achando isso, e foi por isso, que convidei todos os meus amigos, porque cheguei a uma conclusão: é de direito, todos os cidadãos, mas de fato, a cidadania é uma conquista, é uma luta permanente pelos direitos, e a luta pelo cumprimento dos deveres. E como me sinto uma pessoa muito simples, sei que cheguei até aqui com o apoio de todos os amigos, todos me deram lições, todos me ensinaram alguma coisa, em algum momento, não sou sozinha, eu nasci, e vivi no meio de gente, e foram todos vocês, todos os colegas amigos presentes, desde ginásio, até os mais recentes, são estagiários que hoje são colegas, amigos, e eu pensei até em fugir, em me esconder e dizer: “olhem, se querem me dar um diploma me mandem pelo correio”. Mas resolvi estar presente ao ato até por um respeito muito grande que eu tenho pelos Legislativos. E se o Legislativo aprovou, eu tomo como uma decisão da população, dos representantes, e também aceito, recebendo com todos vocês, amigos, aqui presentes, esta distinção. Eu não sou especial, eu sou uma pessoa como todos os brasileiros que lutam para chegar até aqui e não vejo, sinceramente, muita coisa mais para que eu seja distinguida, mas já que me distinguiram eu quero repartir com todos os amigos, porque vocês me amaram, me apoiaram, me incentivaram, quando era professora, todos tiveram o meu respeito, e é por isso que vim aqui nesta Sessão. Eu quero dizer, Sr. Presidente, Srs. Vereadores, humildemente, muito obrigada. Sou grata. (Palmas.)

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convido o Jornalista Antonio Firmo de Oliveira para fazer a entrega das flores à Srª Iara de Almeida Bendati.

(O Sr. Antonio Firmo de Oliveira faz a entrega das flores.) (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE: Uma vez mais a Câmara de Vereadores agradece a presença das autoridades que compõem a Mesa, à homenageada, a todos os senhores, a todas as senhoras que direta ou indiretamente concorreram para que nós pudéssemos chegar a este momento.

Declaro encerrados os trabalhos da presente Sessão.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h30min.)

 

* * * * *